segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Olhos de Lua


Dias desses voltamos a nos encontrar nos meus sonhos. Fazia muito tempo que isso não acontecia. Foi apenas um sonho, mas parecia tão real, tudo tão perto que acordei numa saudade apertada, com uma ânsia por noticias suas, saber o que fez durante esse tempo todo, por onde andará neste momento, se casou de vez ou não.
O tempo passou e deixou comigo uma vontade tamanha de abraçar essa saudade que ficou.

Por que isso agora? Será que meu coração está ficando livre outra vez? Será que o que não aconteceu no passado anda dando sinais de que pode retornar? Por que este passado anda tão presente? Será o destino querendo nos dar outra chance?

Anos atrás seus olhos penetraram tão mansamente a minha alma, me hipnotizaram numa noite de muita música em Porto Alegre. Durante noites tentei desvendá-los e descobri que eles eram apenas turistas na cidade. Tão cedo não retornariam, afinal a distância era grande. E inevitavelmente logo não conseguiria mais sentir o perfume suave que os acompanhava.
Então, arrisquei. Num impulso incontrolável, percorri km de estrada a procura daqueles olhos. Precisava entender esse desejo de reencontrá-los, queria novamente rever o anjo de sorriso fácil que mexeu com meu coração. Levei comigo apenas seu nome, a certeza de que você tinha um bar em algum lugar da sua cidade e dois amigos como testemunhas desta aventura.

“... minha alma se liberta cada vez que eu penso em ti. Vai no fundo da saudade e me traz esses olhos que eu não esqueço nunca mais...” (Jorge Vercilo – Penso em ti)

Rodamos infinitas vezes durante a tarde a sua procura. Quando a noite já ia caindo, quis o destino que encontrássemos uma pista sua num salão de beleza. Onde mais pessoas sabem da vida uma das outras numa cidade relativamente pequena? E lá a sorte me sorriu novamente. O proprietário sabia a quem nos referíamos, nos deu o nome do bar e a localização dele. Era um recado dos céus. Àquela altura meu coração já estava esmagando meu peito, querendo saltar pela boca de tanta alegria. A ansiedade virou uma euforia louca e uma sensação plena de meta atingida, de que toda aquela aventura não tinha sido em vão. Estávamos muito perto de nos reencontrarmos.

Fomos até o local que ainda estava fechado só para ter certeza de que a busca encerrava ali. Era um grande galpão reformado e na fachada o nome indicava se tratar não de um simples bar, mas de algo mais profundo, temático, cultural. A partir daí então pudemos pensar em procurar um lugar para pernoitarmos, afinal a noite seria de festa e já se fazia uma linda primavera em minha vida. Ficamos num hotel no mesmo bairro, tomamos um bom banho e nos preparamos para enfim encontrar novamente seus lindos olhos de Lua. Vesti uma blusa branca que deixava minha tatuagem dos ombros à mostra.
A partir dali era contagem regressiva.

Na chegada ao hotel então o relógio pareceu parar. Ficamos durante muito tempo no quarto bebendo e, no entanto as horas insistiam em não querer passar, a lentidão dos minutos era algo inacreditável.
Ficamos tão eufóricos rindo das aventuras do dia que a sensação era de que todo o dia de procura tinha sido muito mais rápido do que todo aquele tempo de espera no hotel, tamanha era a ansiedade. Um desejo enorme de encontrar novamente com o sorriso que iluminou meu coração.

Enfim chegava a hora. Ao entrar no bar nos deparamos com um lugar bastante aconchegante, diferente e alternativo. Pelo carinho na decoração era notório perceber que a arte e a cultura brindavam nossos olhos numa mistura suave de beleza e delicadeza, se tratava de um local de um artista plástico extremamente cuidadoso, onde as antiguidades se fizeram predominantes.
Tudo bastante acolhedor, simples, mas com uma sensibilidade perceptível em cada detalhe, em cada peça escolhida e premeditadamente bem colocada em cada ambiente.
Estávamos no lugar certo. Nos acomodamos, pedimos uma bebida e admiramos tudo em volta. Mas faltava alguma coisa. Faltavam os seus olhos de Lua. Onde estariam?

Havia uma grande movimentação no ambiente ao lado de onde estávamos. Era um local em forma de teatro. Soubemos então que haveria mais tarde um show, motivo de tanto entra e sai de gente por lá. Luciane, que descobri no outro dia se tratar de sua melhor amiga, era quem animaria o publico com suas canções. Mas e você, onde andaria àquela altura? Será que tinha sido a minha noite de azar e justamente naquele sábado você não apareceria?

Foi quando entre um gole e outro de cerveja, algo de dentro do meu peito me fez ficar paralisada olhando em direção à porta do bar, senti que estava por perto. Então você surgiu com os seus cachos dourados e úmidos, seus lindos olhos e um sorriso contagiante que acariciaram minha alma.
Como quem percebesse que estávamos lá por sua causa foi diretamente à nossa mesa para dar as boas vindas à cidade e agradecer pela presença no seu bar. Tudo surgiu com o som da sua voz. Meus olhos ficaram embaçados de felicidade. No ar a sensação de muita coisa para se dizer ficou evidente entre nós, mas o momento não seria aquele. Para minha decepção, você não estava só naquela noite.

Tantas horas de viagem, tanta procura na cidade e quando nos encontramos para minha infeliz surpresa você já tinha alguém em sua vida. Um alguém que não desgrudava os olhos e seguia seus passos por onde quer que fosse. Era o sinal que eu precisava para entender que não poderia em hipótese alguma te fazer passar por qualquer tipo de constrangimento. Senti um balde de água fria caindo sobre minha cabeça e molhando todos meus planos e sonhos daquela noite. Confesso que não me preparei para aquela surpresa.

Com isso me restou apenas admirar sua beleza de longe até o momento em que nos despediríamos.
Fim de noite no bar, e quando pudemos trocar algumas palavras sem sombra alguma por perto, num gesto rápido e delicado você se ofereceu para nos acompanhar até o hotel. Seria quem sabe o momento ideal para colocar um ponto final ou uma simples vírgula nos nossos encontros e desencontros. De fato, poderia realmente ser.
Entretanto, também num impulso rápido, porém tolo, como um típico canceriano que se sentiu magoado por saber que tinha outro alguém ao seu lado e àquela altura lamentava ter percorrido tantos km por nada, agradeci a gentileza e nos despedimos.

Estava naquele momento colocando o meu ponto final.
Como ainda tinha muita coisa para acontecer naquela noite e nosso destino de momento não passaria nem perto de retornar ao hotel onde estávamos hospedados, eu e meus amigos resolvemos sair para dançar, desopilar a mente e curtir então a cidade tão distante de Porto Alegre. “já que lá tá, deixe que lateje”, diria outro amigo meu.

Então, na procura por outro local, rodamos um pouco pela cidade e acabamos achando um bar bem movimentado. Era bastante escuro, mas, àquela altura qualquer lugar seria o ideal. E começamos a aproveitar o resto da madrugada. Foi quando, por uma ironia do destino, você surgiu na porta. Era um recado que a vida nos dava de presente. Nossa historia não começaria nem tão pouco se encerraria naquela noite.

Dançamos muito perto o tempo todo, e em todos os momentos nossos olhos insistiam em se cruzar, num silencioso e proibido namoro, afinal havia alguém em sua companhia.
Companhia essa que não tardou a perceber que você retribuía a todos meus olhares. Então a marcação ficou cerrada. Já não tinha mais como ser tão explicito todo aquele envolvimento de sorrisos contidos, aquela hipnose fascinante de não perceber ninguém a nossa volta, sem qualquer palavra, apenas uma troca intensa de olhares e um desejo imenso de te trazer para mais perto de mim.
Naquela noite agi contra tudo o que sempre critiquei: a promiscuidade da noite. Me vi completamente envolvida num jogo louco de sedução, mesmo sabendo desde o inicio que tinha alguém ao seu lado. Não respeitei, esqueci qualquer tipo de constrangimento e pelo visto você fez o mesmo. Fácil àquela altura, deduzir que havia encontrado alguém de capricórnio.

Tudo conspirava para que aquela não fosse definitivamente a nossa noite. E antes que acabasse causando qualquer tipo de confusão, de comum acordo com meus dois amigos, decidimos ir embora. Já estava quase amanhecendo e eu já não me sentia confortável naquela disputa demasiadamente educada de atenção, naquela brincadeira que não nos levaria a nada. Pelo menos não naquela noite.
Então nos despedimos num forte abraço e pude sentir seus lábios tocarem suavemente meus ombros. Essa foi a ultima vez que nos encontramos na sua cidade.

O retorno a Porto Alegre foi tão frustrante, pois me dei conta do que havia feito para encontrar alguém que já tinha um outro alguém.
Claro que antes de partir eu nem imaginaria isso, mas queria ter a certeza de que desde nosso primeiro encontro, algo mexera muito comigo. Mas ficou um vazio tão grande, uma sensação de que não queria viver esse tipo de sentimento. Veio também o cansaço.
Então ainda decepcionada, porém certa de que o que poderia ter acontecido havia ficado para trás, voltei ao meu mundo. Sem jogo, sem machucar ninguém. Aquela noite de eterna madrugada ficou apenas na memória. Uma linda, inesquecível e doce noite.
Um mês e meio mais tarde, em outra terça de cantorias noturnas em Porto Alegre, um dos meus companheiros daquela louca aventura, ao me avistar entrar no bar, veio ao meu encontro e num breve sussurro me informou que alguém estava no andar de cima, em outra noite de turista. Em segundos meu coração se encheu de uma imensa alegria contida.
Percebi logo que se tratava dos cachos dourados de anjo de sorriso fácil. Quis o destino novamente nos pregar uma peça. Outro encontro inusitado e desencontrado.

Porém, a surpresa daquela noite, no entanto, era eu já estar acompanhada e, mesmo sendo algo recente e novo surgindo em minha vida, não faria o que fizera a km de distância.
Eu estava curtindo uma felicidade plena e naquele momento não trocaria por outro jogo de sedução, afinal, eu já sabia que aqueles olhos tão fascinantes tinham alguém. Alguém que não estava ali naquela noite, mas estava presente em sua vida.

Passei a noite inteira covardemente no andar de baixo, sem coragem de subir as escadas e reencontrar com aquele perfume suave, aquele olhar hipnotizante. Tive um medo enorme de balançar, de me render aos seus encantos e acabar machucando meu tão novo amor. E sei que isso poderia acontecer, pois só de saber que estava presente, meu coração deu sinal de que não tinha esquecido aquela aventura toda.

Mas a noite se encarregou de cruzar nossos caminhos novamente.
Ao ir embora, acompanhada, em direção ao meu carro, nos encontramos na saída do bar onde você pegava um taxi e, parou ao lado da porta e num breve e suave aceno com a cabeça, me cumprimentou com seus lindos olhos de Lua.
Minhas pernas estremeceram e meus olhos silenciaram num lamento profundo. Não era a nossa noite novamente.
Como cantava Jorge Vercilo: “... os anos passaram-se a vida me leva e traz e ainda não esqueci seus olhos de nunca mais...”

Foi a última vez em que nos vimos. Você se foi e deixou para os meus dias apenas uma doce saudade. Sem trocas de telefones nem qualquer tipo de contato. Acho que ficamos esperando o destino agir novamente. Tudo que sabia até então era seu nome, profissão, cidade que reside e nome de seu bar. Mais tarde ao ler uma reportagem da época, descobri seu sobrenome, idade, cidade natal e confirmei seu signo. Mais nada.
Hoje estou sozinha novamente e por diversas vezes me deparo com uma vontade imensa de abraçar a saudade que ficou.

“Eu posso te ouvir chamar no meu sonho tenho certeza que não acordei. Vejo minhas flores caindo do céu como um presente que dou a você. Não imagina o que eu sinto aqui... é eu sei que a distância não importa. Você não imagina o quanto isso me conforta. Só Deus sabe o quanto quero ir agora. O quanto quero ir agora. Voltar, voltar, voltar pra te buscar...” (Frejat – Voltar pra te buscar)

2 comentários:

  1. Então voltaste ao blog de vez, com carga total. Que legal!!! Tem passagens, desde o primeiro até este, extremamente emociantes, com frases de uma poesia pura...

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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