sexta-feira, 21 de agosto de 2015

QUEM TEM MEDO DE SEUS FANTASMAS?

Outro dia, numa rede social, li a frase do jornalista Carlos Heitor Cony: 
"Tenho meus fantasmas, e os amo." "Não quero destruí-los." "No dia em que me tirarem os fantasmas, não serei nada." 
Não pude deixar de pensar naquilo que indiretamente atua para que sejamos quem somos. 
Nas vidas não vividas que se somam dentro de nós, nas frustrações, desejos e desistências que também fazem parte de nossa realidade.  

De vez em quando somos obrigados a nos render. 
A abraçar nossos fantasmas e encará-los olhos nos olhos com compaixão, permitindo que permaneçam dentro de nós. Sem medo de que nos roubem a alegria, mas aceitando-os como parte do todo também.  

Somos a soma das alegrias que vivenciamos e das dores que deixamos. E mesmo que o amadurecimento nos permita seguir adiante, com coragem e determinação, ainda assim, em alguns momentos tropeçamos na incerteza de sabermos quem nos tornamos de fato. 

Não sei se sou uma pessoa corajosa. Mesmo abraçando meus medos e entrando de cabeça no desejo de me tornar palavra escrita, deixo de lado muita vida que poderia brotar de mim e não brota, por incapacidade e falta de coragem de dar o primeiro passo. Tenho meus fantasmas. 

A parte de mim que se aterroriza diante da novidade e recua perante os desafios. 
A porção que carrega inseguranças e covardia. A parte de mim que se enfraquece diante do desconhecido e procura uma vida segura e muitas vezes menor... 

Preciso urgentemente aliar-me a eles para juntos darmos os passos seguintes desta dança que só pode ser conduzida a dois. Fácil seria fechar a porta e fingir que não existem interferências. Acender a luz do abajur interior e negar a presença daquilo que nos povoa tanto quanto a alegria. 

Viver intensamente requer entrar em contato com quem somos intimamente, e isso inclui aceitar nossos fantasmas. Aquilo que não sobreviveu, mas ainda assim nos reprime perante os desafios. Aquilo que não vingou, mas ainda causa desconforto. Aquilo que não aconteceu, mas permanece deixando uma ponta de dúvida. 

Nem só de dor são feitos nossos fantasmas. Apesar da distância que quero deles, são eles que me dão humildade, me colocam de volta ao chão, à realidade que me cerca, ao que sou_ independentemente da chuva que molha minha grama no momento. 

Poderia nomeá-los um a um, sem me dar conta que já não é culpa "deles" minha vida estar do jeito que está. Não são as fulanas e os beltranos os álibis para uma vida de incompletudes e imperfeições. Não há tempo para acreditar em bodes expiatórios que justifiquem nossa falta de disposição em sermos plenos e felizes. 

A hora é sempre agora, e já não importam mais os fantasmas. Eles sempre resistirão como sombras a nos lembrar que também temos deficiências, também não controlamos nada, também tentamos resistir bravamente ao mundo que nos cerca e desafia... 

Não tenho medo de meus fantasmas, mas preciso transformá-los no que me agrada... São nossos fantasmas que nos dizem que não somos de ferro. Que já caímos e iremos cair inúmeras vezes, e que a vida é imperfeita mesmo.  Mas quem disse que tudo seria só bom?  

Então tenho que concordar com Cony: "Tenho meus fantasmas, e os amo". Eles me mostram que não há o que temer, pois o pior pode estar dentro de nós. E é lapidando o que somos que nos tornaremos pessoas melhores. Não tentando matar nossos fantasmas, mas entendendo que se este nosso metal sofre corrosões, é porque existe beleza não apenas no brilho, mas no contraste entre ferrugem e fulgor...  

Fabíola Simões

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