terça-feira, 22 de novembro de 2011

Coração aos pulos


Coração aos pulos.
Eis a frase no MSN de minha irmã gêmea meses atrás, quando soube da notícia de outro infarto de Papi.
De 1999 pra cá, o terceiro.
Ela, assim como meu irmão mais velho, morando em Brasília/DF e tentando, à distância, manterem-se calmos.
Mas, até mesmo na capital do País a lua de repente, pôs-se a sangrar.

Aqui em POA, no centro dos acontecimentos do Instituto de Cardiologia, aquela sexta-feira parecia interminável, assim como todos os dias e noites seguintes, até a aguardada notícia da “alta” do “Vovô Velhinho”, como Érica chama.

Lembro que durante muitos anos vi meu pai através dos olhos de minha mãe. Somente o conheci realmente a partir do ano de 1994 quando passamos a trabalhar junto. A partir dali o enxerguei de fato e aí sim pude ter a certeza de amá-lo incondicionalmente. Me identifiquei nos seus olhos suaves e seu coração de manteiga, que até então desconhecia.
E, de repente, “Perguntas e dúvidas marcaram aqui um encontro” (para não deixar de citar Nietzsche) e passei a entender e questionar muitas coisas naquela época. Muitas me fizeram amadurecer, crescer e também descobrir tantas outras coisas, inclusive sobre mim.

Guardei apertada contra o peito toda angústia de me sentir impotente diante dos acontecimentos deste inverno demasiado triste.
Muitas noites mal dormidas e madrugadas feito nuvens pesadas escondendo as estrelas por conta de uma rotina desgastante e estressante de hospital, trabalho, hospital e casa durante dias.

Dias que se arrastavam de tão longos e no trabalho ficava estampado no rosto apenas pedaços de sorriso que se encarregavam de camuflar a dor. De corpo presente apenas, com a mente e coração distantes e totalmente desconcertados.

Família em alerta constante, com a tristeza aprisionada por trás de um esforço em manter a tranqüilidade aparente, quando por dentro o coração andava totalmente em desalinho, perdido, amparado por muletas.

Durante noites seguidas minha mente vagava solitária e silenciosa enquanto aguardava o cansaço vir me acariciar a alma e, com braços para prender, me pôr a dormir. E dormia, pouco e mal, mas dormia. E apenas isto. No outro dia o corpo permanecia cansado e o coração desestruturado, ansioso por notícias, por um conforto, um alento.

Com estas noites que custaram tanto a passar vieram muitas lembranças, inclusive das outras duas vezes em que estivemos igualmente com o coração na mão, ou como Neila escreveu, com o coração aos pulos.
Mas desta vez tudo parecia tão diferente. Havia a indefinição entre Papi receber alta naturalmente, apenas seguindo tratamento em casa e a possibilidade de ter de se submeter a uma cirurgia, o que sempre implica em enorme risco, ainda mais depois dos 70 anos de idade.

E assim, um misto de medo e sensação de perda se fazia permanentemente constantes.
Uma vontade imensa de gritar bem alto para que algo fosse feito, de sacudir meus irmãos, abrir os olhos de toda a família para que trouxéssemos de volta a alegria de viver do “velhinho”. De tentar fazer alguma coisa enquanto ainda tínhamos tempo.

Eu bem que tenho tentado há alguns anos estar mais presente de Papi, até mesmo o acompanhando nos eventos do Inter, que ele tanto ama apenas para poder estar perto, lhe fazer companhia, não deixa-lo tão sozinho.
Mas sou apenas uma andorinha entre outros cinco irmãos.

É já ouvi de alguém, que nada enxerga além de seu próprio umbigo, de que meu gesto apenas alimenta ainda mais o fanatismo de Papi pelo Colorado.
Enquanto uns preocupam-se apenas em criticar, reclamar e depreciar qualquer atitude de papi perdem a grande oportunidade de estarem mais próximos, colhendo e cultivando seu carinho ou simplesmente ganhando um beijo, um abraço, desfrutando de sua companhia enquanto podemos, afinal. Mas, nem todos pensam assim. Eu fico com Jota Quest nestas horas “... Preciso tanto aproveitar você...”.

Neste tempo de espera por Papi sair tranqüilo do hospital, Um estalo, um “dar-se conta”, “cair a ficha” aconteceu diante dos olhos me fazendo perceber que o que acontecia então pela segunda vez em menos de 11 meses, nada mais era do que o resultado de muito tempo de descuido, o reflexo de que Papi, apesar de seu olhar sempre terno e carinhoso e carregar consigo uma timidez constante, quando se trata de amor e atenção, não sabe o que fazer, não consegue pedir ajuda.
Assim sendo, por alguma razão, talvez estivesse se sentindo sozinho e com enorme dificuldade de lidar com isso.

Quem sabe isso explique estar ainda mais envolvido com o Internacional, seu time do coração, como se fosse seu novo lar, sua família, seu retiro ou seu refúgio. Lá talvez se sinta acolhido, se sinta amado, e sinta novamente a liberdade no peito.

Lembrei de outra frase de Nietzsche: “o que não provoca minha morte faz com que eu fique mais forte” e, confesso, nestas longas e difíceis noites de angústias, me passou pela cabeça a idéia de que Papi pudesse estar se sentindo fraco e, como alguém cansado de si mesmo, ainda que inconscientemente, estivesse também desistindo da vida, entregando os pontos.

Ou como escreveu dia desses Fabrício Carpinejar, “Não tem vontade de conservar a vida, pois isso exige esperança”.
Algo faltando, afinal: a tal esperança. Coisa que ele parecia não querer mais por perto.

Por achar que todos temos razão, muitas vezes esquecemos de ouvir atentamente o apelo que um coração perdido faz diante da gente. Simplesmente ignoramos feito alguém que não tem a mínima idéia da alegria que é numa tarde qualquer de saudade, poder reparar nas nuvens. E elas se locomovem se espalham rapidamente, muitas vezes dão um espetáculo à parte com seus formatos inusitados. Mas é preciso estar atento e perceber, afinal.

E assim são também as pessoas. Algumas são suaves feito um poema e necessitam de muito mais carinho e atenção.
Alguém que tanto adoro me disse que tínhamos de mostrar ao “velhinho” razões para ele querer ficar com a gente, para ele querer viver. E isto ficou martelando durante dias na minha cabeça.

Então após ouvir repetidas vezes a música da Roberta Campos “cheguei a tempo de te ver acordar e vim correndo à frente do sol. Abri a porta e antes de entrar, revi a vida inteira”, eis que a pessoa aqui, em uma das visitas a Papi no hospital, diz a ele que tanto Érica quanto os meninos (Guigui e Gabi), desejariam muito poder contar com a presença e o carinho do avô em suas formaturas, afinal.
E sugeri que ele tentasse fazer hidroginástica para ajudar no tratamento que faria em casa e tal.
Ele então sorriu timidamente, como quem estende a mão em agradecimento, e disse baixinho: ‘vou pensar’.

Naquele dia tive a certeza de que Papi havia se dado conta de que tivera outro infarto de fato e não que estava apenas repousando num quarto de hospital, curando um resfriado. Assim como toda família, ele também levou um grande susto, afinal.

Em tempo: Papi hoje faz hidroginástica no mesmo local e dias em que a pessoa aqui nada, apenas em horário diferente. \o/


“Desculpe
Estou um pouco atrasado
Mas espero que ainda dê tempo
De dizer que andei
Errado e eu entendo
As suas queixas tão justificáveis
E a falta que eu fiz nessa semana
Coisas que pareceriam óbvias
Até pra uma criança
Por onde andei?
Enquanto você me procurava
Será que eu sei?
Que você é mesmo
Tudo aquilo que me faltava
Amor eu sinto a sua falta
E a falta, é a morte da esperança
Como um dia que roubaram o seu carro
Deixou uma lembrança
Que a vida é mesmo
Coisa muito frágil
Uma bobagem
Uma irrelevância
Diante da eternidade
Do amor de quem se ama...”

(Nando Reis – Por onde andei)

Um comentário:

  1. Q susto!! bom saber q ele está bem! vou mostrar p minha velhinha e ver se a convenço a fazer hidro tb! bjooooo

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